Archive for the ‘Reflexões’ Category

Ato e Potência

27.outubro.2010

Aristóteles, um grande amigo das antigas, me ensinou muita coisa. Uma delas é a noção de Ato e Potência, explico.

Pense numa semente. Em ato a semente é o que ela é. Um grão mínimo. Mas nessa mesma semente há uma potência, ou potencial, uma parte oculta que está contida na semente, a árvore. Antes mesmo da semente ser plantada, já está dentro dela, em potência, uma árvore. Mesmo que essa semente nunca venha a ser plantada, ainda assim a potência está lá, aguardando as condições ideais para, nesse caso, germinar.

Pessoas são sementes. Nascemos pequeninos, feios, enrugados, banguelas, analfabetos e pelados. Em ato, um recém nascido nada pode compreender da linguagem dos outros humanos que o cercam, mas está lá, dentro daquela “carinha de joelho” a potência da fala.

Muito tem me incomodado certas críticas que se fazem aos jovens de hoje em dia. Olha-se o adolescente em ato, que por natureza é um ser desajustado, seus hormônios estão ainda em fase de calibração. O adolescente, com seus gostos, modas e manias é tido como banal e vazio. Vazio? O adolescente, em ato, é pura potência. É um adulto raspando a casca que o separa resto do mundo, para mudar de metáfora.

Eu não sou mais jovem, mas ainda não me esqueci das palavras do velho Aristóteles, que um dia já foi adolescente também. Será que o jovem Aristóteles em ato adolescente demonstrava a potência filosófica lá contida? Duvido.

Assim, antes de sair por ai criticando essa molecada colorida de hoje em dia, lembre-se das críticas que você ouviu quando ainda era ovo, semente ou adolescente. Lembre-se daqueles adultos chatos que só esculachavam suas ideias, suas roupas, suas música. Lembrou? Agora vá ao espelho e se olhe, pois você hoje é um deles.

É isso!

Bolsa Vagabundo e as Eleições…

29.setembro.2010

Olá Pessoal,

Eu fico pasmo de ver quanta asneira se fala sobre bolsa-isso, bolsa-aquilo. Não vou defender nenhum partido aqui, mas apenas refletir sobre a comodidade intelectual de muita gente que grita aos quatro ventos seus mimimis…

Primeiro, não falo de gente ignorante, que não teve acesso ao estudo. Falo de gente instruída, graduada. Gente que emite opiniões das mais superficiais possíveis. Gente que sequer sabe ao certo o que significam conceitos como: república, governo, poderes tri-partidos, democracia etc. Gente que não prestou atenção às aulas de Sociologia, Política ou Filosofia… (e aqui eu abro parênteses, é certo que há professores dessas disciplinas que tampouco sabem os significados, mas isso não isenta o cidadão… alegar ignorância não vale). Gente que acha que Política é Futebol. Vê partido político como time e, pior, apóia-se na prática do torcer contra.

Mas vamos ao que interessa: distribuição de renda.

Políticas de bolsas, seja elas qual forem, visam distribuir renda. Isso não é invenção nossa. A Bélgica, por exemplo, é pioneira nas políticas de distribuição de renda. Mas por quê distribuir renda?

Numa sociedade democrática, orientada por um modelo republicano, a riqueza produzida por um país é pública, ou seja, de todos. Mas, há um problema, essa riqueza nem sempre é dividida de forma justa entre o todo. Alguns são excluídos dessa partilha. Excluídos porque não possuem renda. Não contribuem com a produção social da riqueza. Em geral, podemos colocar essas pessoas em certas categorias: pessoas inválidas (deficiências física ou mental), crianças (ainda não trabalham) e idosos (não trabalham mais), miseráveis… opa! Eis aqui o problema.

Ninguém acha que o governo, ao usar o dinheiro público na educação das crianças, está sustentando vagabundo. Muito menos que as crianças em questão deveriam virar-se por conta própria, tipo: “quer estudar, foda-se , se vira e não venha pedir pro governo bancar você, moleque filadaputa!”

Ninguém acha que o governo, ao usar o dinheiro público na saúde dos idosos, está sustentando vagabundo. Muito menos que os idosos em questão deveriam virar-se por conta própria, tipo: “tá zicado, foda-se, dá seus pulos e não venha pedir pro governo tratar você, véio lazarento!”

Mas quando o ser é miserável, no sentido da palavra: aquele que vive na miséria, ai o discurso é o seguinte: “vagabundo, filadaputa, foda-se… você é pobre, miserável porque você quer, vai trabalhar vagabundo… vagabundo quer bolsa pra não ter que trabalhar, se vira vagabundo… tá na merda é por culpa sua!”

O Brasil tem aproximadamente 15 milhões de pessoas que vivem na linha da miséria. Miséria quer dizer que elas vivem com menos de R$ 1,00 por dia. E eu me pergunto, será que um sujeito nessa condição, escolheu estar assim?

Dai vem o classe média, com 5 carnês (casa, carro, tv de plasma, x-box e plástica da patroa) na gaveta, dizer que programas de distribuição de renda é coisa pra sustentar vagabundo! Uau!

Todos os partidos, sejam eles quais forem, implementam políticas de bolsas, pois as bolsas não são para sustentar vagabundo, elas servem para 1) distribuir renda; 2) movimentar a economia. Uma coisa não funciona sem a outra, vejamos:

O sujeito recebe bolsa-família (ou o nome que for). Usa esse dinheiro para comprar arroz. Como muita gente que antes nunca conseguiria comprar arroz agora compra, a indústria do arroz precisa aumentar sua produção, beneficiamento e distribuição, ou seja, precisa de mais mão-de-obra. Mais mão-de-obra faz com que alguém antes desempregado, consiga emprego, aumente sua renda e melhore sua condição sócio-econômica e, conseqüentemente, perca a bolsa-família.

O caminho é simples, o governo dá o dinheiro da bolsa. Esse dinheiro movimenta a economia. Parte fica como lucro para a indústria do arroz, parte volta para o governo na forma de tributos. E o cidadão vive melhor.

Ok, virão as criticas, pois tem o cara que usa o dinheiro da bolsa para comprar pinga. Ok, a lógica é a mesma, substitua indústria do arroz por indústria do álcool e a economia continua girando.

Nenhum político de nenhum partido vai acabar com as bolsas. Se você acredita em discurso político, azar o seu, mas quem manda na política é a economia e bolsa é bom para a economia!

E se bolsa é bom para a economia, é bom para todos. Mas dai você se pergunta, mas eu pago meus imposto e não recebo nada. Recebe sim peão. Você recebe educação, saneamento básico, saúde, segurança etc. Ou deveria, pois o dinheiro dos tributos (impostos) são revertidos para você em benefícios sociais. Como você é classe média, cheio de carnês para pagar, seu problema não é renda, afinal você estudou e está empregado. Bolsa é para pobre e você não é pobre.

Mas dai você vai me dizer, que educação? que segurança? que saúde? o Estado tá falido e os benefícios sociais uma bosta! Gotcha! Aqui chegamos no verdadeiro problema deste país varonil!

Impostos. Eu pago, você paga, mas e o grande industrial, paga? O classe média tem o imposto descontado na fonte, mas os grande produtores, empresários, comerciantes, banqueiros e profissionais liberais não. Eles sonegam impostos e, lembre-se, eles são os que mais ganham. Se eu tenho um salário de R$ 3.000,00, o leão vem e morde mais ou menos R$ 600,00. Mas o empresário que ganha R$ 30.000,00 sonega e, muitas vezes, não paga imposto algum!

Mas eu não vejo ninguém chamando os tubarões sonegadores de impostos de vagabundos! Vagabundo é o pobre coitado que é pobre, miserável. Ele é o vagabundo?

Você já passou fome? Morou em barraco com esgoto a céu aberto? Eu não. Do alto da comodidade de classe média que sou, parece muito fácil falar que vagabundo é quem vive de bolsa-isso, bolsa-aquilo. Agora, você reclama do caixa dois da sua empresa? Bota a boca no trombone quando sabe que seu chefe sonega imposto?

Eu não sei, mas acho que é mais fácil chutar cachorro-morto que enfrentar o pit-bull da realidade…

É isso!

Six feet under

26.agosto.2010

Certa vez, na madrugada, zapeando entre os canais da TV aberta, peguei um trecho de uma série sobre uma família que administrava um funerária. Assisti o restante do episódio e achei interessante, mas não guardei o nome da série e, entre a correria do dia-a-dia, me esqueci dela. Me esqueci até o dia que minha amiga* Larissa Herbst (@larissaherbst) postou algo sobre a série em questão: Six Feet Under. Como eu e Larissa temos gostos em comum no que se refere a séries (Battlestar Galactica, Dexter, Big Bang Theory e Lost, claro.) resolvi conferir.

Eu ainda estou na 2ª temporada, mas acho que já posso dizer algo. Six Feet Under é densa, coisa que para alguém como eu, com formação em Filosofia, é um grato presente. O fato de a série mostrar o cotidiano de uma família californiana que administra uma funerária pode, inicialmente, sugerir que a série trata sobre a morte. Ledo engano. A série usa a morte de pessoas e os rituais fúnebres que se desenrolam no espaço da funerária apenas como pretexto para discutir a vida.

Eu não vou falar aqui sobre os episódios em si, até porque como eu já disse, ainda estou na 2ª de cinco temporadas. O que eu quero abordar nesta postagem, que pode ficar longa já que estou sem acesso a internet enquanto escrevo (por conta duma falha da NET, thanks!). Bom, chega de divagação…

Quando a morte se inicia? Quando se morre, oras. A percepção do senso comum é, mais ou menos, de que a morte começa com a suspensão da vida. Será? Eu diria, e posso parecer pessimista com isso, que a morte começa quando o espermatozoide encontra o óvulo. Ali, no momento em que as células começam a se reproduzir, seguindo o código-fonte da vida, começa o processo de morte. E justamente no instante da fecundação que, numa concepção aristotélica, começa a corrupção da matéria.

Platão dizia que as ideais existem antes num mundo separado da realidade, o mundo das ideias. Lá as ideias existem na perfeição e são incorruptíveis, ou seja, eternas. Cá, no mundo das sombras, dentro da caverna, as coisas são meras aproximações, cópias mal feitas das ideias perfeitas. Aqui, dentro da caverna, tudo se degenera, inclusive a vida.

Vida e morte são aspectos de uma mesma coisa: a nossa finitude. Otimistas dizem que o copo está meio cheio; pessimistas, que está meio vazio. Se é a vida ou a morte que começa com a fecundação, isso é uma questão de perspectiva e, ai sim, é que Six Feet Under nos permite filosofar.

A morte é um problema para quem fica. Lidar com a dor, o sofrimento ou, contrariamente ao senso comum, com a alegria e o alívio são questões abordadas na série. A dimensão psicológica da vida humana se fragmenta nos dilemas cotidianos das personagens. Mas a série não fica apenas no psicológico. Questões sociais tais como o capitalismo selvagem que corporativiza tudo, inclusive a morte; os preconceitos de raça e gênero, bem como o (des)equilíbrio dos relacionamentos são tratados.

A série me agrada pela diversidade de contextos. Da adolescente perdida na profusão de possibilidades que o ingresso na vida adulta oferece, à matriarca que redescobre essas mesmas possibilidades perdidas, a série desfila um rol de personagens complexos e, de certo modo, apaixonantes. Não é difícil se reconhecer em uma ou outra situação encenada nos episódios nem mesmo deixar escapar uma ou muitas lágrimas como bem profetizou a Larissa, quando me indicou a série. (E aqui eu abro um parenteses! Sim, homem também chora!)

Agora vamos falar um pouquinho sobre a morte. Morrer é, ao mesmo tempo, um processo biológico ao qual estamos todos fadados e um processo psicossocial regido pelas mais diversas concepções culturais. Encaramos a morte como dor e sofrimento ou alegria e alívio conforme fomos educados em nossas culturas. Lidar com a morte é uma experiência que somente os vivos podem exercer. Com exceção ao discurso charlatanista de um bando de oportunistas, ninguém sabe ao certo quando vai morrer. Fortuna, a deusa romana da sorte, através de sua roda decide os destinos dos vivos. Numa interpretação mais científica, o caos, o acaso é a força que move a roleta russa (desculpe o trocadilho Nikolai) da vida. Morremos um pouco a cada momento. Nascemos para isso, para morrer.

Calma, não fique assim tão angustiado ou angustiada. Six Feet Under, ao seu modo, mostra que diante da morte só há uma escolha: viver. Na verdade, diante da morte há um séquito de escolhas: como viver a vida. E aqui é que se encontra mais uma riqueza da série. Cada personagem, dos fixos aos itinerantes, mostra uma perspectiva de como viver. Se elas são boas ou más, se são as melhores ou piores, eis o domínio da filosofia, saber o que é o bem e o mal é uma questão pra lá de complexa e, nesse sentido, a filosofia só pode te ajudar a compreender suas escolhas, assim como Six Feet Under pode apenas te mostrar que os seus dilemas são os dilemas de milhares de outras pessoas…

É, se você chegou até aqui, saiba que não há formula mágica. Fortuna, a deusa, esta lá, girando sua roda caótica. E você, vai fazer o que hoje? Pois pode ser que amanhã eu te veja no seu velório… ou o oposto!

* Nota: Larissa foi minha aluna por uma ou duas semanas ainda no ensino médio, suas escolhas a levaram para outros rumos, mas por conta das tecnologias da informação, sempre estivemos, de alguma forma, em contato. Embora meu contato com a Larissa seja muito mais virtual do que presencial, ainda assim eu a considero uma boa amiga e (momento jabá) uma ótima designer de interfaces! Confira.

Emos, uma persperctiva fora de foco…

05.agosto.2010

Olá pessoal!

Hoje o assunto é mais denso e a postagem pode ficar mais extensa que o habitual, prepare-se ou vá para o Google e tente outra coisa!

Geração perdida, o futuro do planeta está condenado pela falta de crédito nessas tribos atuais: os emos, vampiros românticos, coloridos etc.

Ok, sou um educador. Convivo diariamente com alunos e alunos do Ensino Médio e Ensino Superior. Essa mobilidade entre dois submundos escolares me permite apreciar com mais ponderação àquilo que o senso comum pratica ou condena.

Mas antes de falar dessa geração de adolescentes depositária do infortúnio vindouro, voltemos no tempo…

Em 1985 eu era apenas um garoto de 12 anos, vivendo em meio à explosão do New Wave. Roupas alucinatemente coloridas, estampas e padrões quadriculado, xadrez, listrado etc. Gel com glitter, ombreiras e mais um pandemônio de opções estéticas características do New Wave. E eu odiava. Achava ridículo, feio e me recusava a vestir-me daquele jeito. Era um em um milhão. Minha praia era outra…

Metal. Calça rasgada, surrada, suja. Tênis estrupiado. Camisetas de bandas: tecido preto e estampa de capas de álbuns ou logotipos. Cabelo comprido, broches de caveira, pulseiras com metais etc. Eu era um marginal. Marginal no exato sentido da palavra. Estava à margem do convencional, e o convencional estava longe de ser unânime.

Pessoas mais velhas que eu também não gostavam do New Wave. O visual era chocantemente exagerado. A música era vazia tanto em conteúdo quanto em melodia dizia a geração anterior, acostumada ao clima de protesto politicamente engajado. Mas o New Wave era legal, estava na novela, nas passarelas, nos outdoors…

Já o pessoal do metal, punk, dark e afins era o prenúncio do apocalipse para o pessoal do New Wave. Geração maldita, não se vislumbrava futuro neles. Era uma época estranha. Rechaçado pelos contemporâneos coloridos e psicodélicos, desacreditados pelos mais velhos, minha tribo estava fadada a morrer (provavelmente numa cadeia ou presídio).

Ok, voltemos a 2010.

Emos, geração maldita. Futuro sombrio. Balela!

O mundo dos homens é uma constante assincronia entre gerações. O New Wave passou e o mundo girou. Os “metaleiros” cresceram, tornaram-se pais, advogados, médicas e, pasme, professores! O mundo sobreviveu às previsões apocalípticas das tribos mais velhas, pretensas donas da cultura, dos hábitos e do que é certo.

O universo Emo não me agrada. Assim como não me agradava a Tropicália. O mundo é assim, repleto de tribos, gostar de uma ou de outra é algo tão subjetivo que dificilmente será alvo de consenso.

Mesmo no mundo do metal, o que se faz hoje não me agrada muito. Eu cresci ouvindo deuses e suas bandas. Nada que veio depois dos áureos anos 80 me seduz. Korn, pra deixar meu amigo anacrônico Rafael Gimenes louco, é tão insípido quanto Restart, pois ambos não fazem parte do momento que eu vivi. Nem mesmo o Ozzy de hoje é mais o mesmo de 20 anos. Ozzy virou um vovozinho simpático que já teve até Reallity Show! Cadê aquele insano que mastigava morcegos? Foi-se…

Quem nasceu depois dessa conversão do Ozzy em vovozinho, pode até curtir o Ozzy, mas não sabe quem realmente o Ozzy foi! Só quem viveu aquela época conhece… (isso vale para mim, que até acho Beatles legalzinho, mas meus professores também me diziam: “Você ouve Beatles, mas não tem a menor noção de quem eles foram…”)

Somos seres inseridos no tempo e no espaço. O tempo de cada um deixa marcas que fossilizam-se em nossa personalidade e cada era, cada geração valoriza o seu registro temporal. É um fato inerente a vida humana!

Agora, vamos para o futuro (do passado). Eu era uma promessa de fracasso se levarmos em conta o prognóstico daquelas pessoas que viam na minha geração uma geração sem futuro, vazia. Pobres coitados, eles erraram. Cá estou eu, adulto, educador. Cá estou eu, realizando um futuro bastante diferente daquele profetizado pelos meus pares anos atrás. E, cá estou eu, profetizando que depois da minha geração o futuro será desastroso… ops, estava!

Meus alunos e alunas vivem outra época. Um tempo e um universo paralelo ao meu. Como educador, ou eu mergulho nesse universo, ou fico distante, incomunicável. Eu decidi mergulhar. E, para ser sincero, os tempos são outros, mas pouca coisa muda depois de um olhar mais atento…

Percebi que “eu fui dar mamãe, fui dar um serão extra com o patrão” de Dr. Silvana não é melhor que a capciosidade do funk carioca, só é diferente. Adolescentes gostam de sacanagem, e a música sempre reflete isso. Apenas os ritmos que embalam uma tribo ou outra é que muda. O mela-cueca de Brian Adams e o romantismo açucarado de sertanejos universitários é mais do mesmo, com uma roupagem diferente.

No cinema ocorre o mesmo. American Pie nada mais é que uma releitura atualizada para os adolescente de hoje das mesmas situações vistas em Porky’s, Picardias Estudantis e A Vingança dos Nerds. Eu sou muito mais Porky’s que American Pie, mas é porque eu fui adolescente em outra época. Os dilemas amorosos entre vampiros virgens, lobisomens depilados e menininhas bobocas não são muito diferentes de Garotas de Rosa Shocking e Namoradas de Aluguel… a linguagem é outra porque a tribo é outra, mas os dilemas são os mesmos.

Enfim, antes de sair por ai tacando o pau naquilo que é diferente de você, por mais que isso te incomode, daqui 20 anos haverá algo que os próprios desacreditados de hoje desacreditarão amanhã. E, daqui 100 anos, tudo isso será resumido num verbete qualquer de uma enciclopédia qualquer. Daqui 1000 anos será insignificante.

Eu não gosto do universo cultural dos Emos, mas consigo compreender a indignação desdes quando são desacreditados e avacalhados. Não gosto, mas sou tolerante, pois daqui 20 anos, serão os médicos, advogadas e, pasme, professores dos meus futuros filhos, estes sim, a geração maldita de daqui 20 anos, e sei lá eu qual será a denominação deles… mas o conflito é certo!

É isso.

Sofrimento

28.julho.2010

É interessante a necessidade quase generalizada de sofrer. Hoje pela manhã, assistindo a um desses programas matinais, ouvi a apresentadora proferir os seguintes versos de Pablo Neruda:

E esse é o maior dos sofrimentos: não ter por quem sentir saudades, passar pela vida e não viver. O maior dos sofrimentos é nunca ter sofrido.

Bom, Neruda é um poeta e, não obstante, uma antena dos anseios e ideários de seu tempo. Sofrer é entendido como uma necessidade da vida humana, ou quase. Herança maldita do pensamento religioso, sofrer é uma sina que a humanidade carrega nas costas.

Balela! Neruda, com perdão da palavra, foda-se!

Quem disse que temos que sofrer? Deus? Zeus? Algum texto pseudo-sagrado qualquer? À merda com isso. Eu não preciso, necessito ou desejo sofrer. O sofrimento é uma contingência da vida e, convenhamos, deveras subjetiva. Morreu o “músico” filho da atriz? Eu não sofro com isso. Se fosse meu parente eu sofreria, mas o filho da atriz não me desperta uma nesga de sofrimento.

E por que sofremos? Por vários motivos. Quando algum ente querido, por exemplo, morre. Mas esse ente querido não morre para nos fazer sofrer. Seja lá qual for a causa mortis, câncer, aneurisma, bala perdida ou imbecilidade ao andar de skate, eventualmente todos morremos. Sofremos a perda, sentimos saudades, sim. Dai dizer que precisamos sofrer… à merda!

Sinto muito. Não há nada na essência humana que nos condene a sofrer. Nosso DNA não carrega o sofrimento. E, sinto mais ainda, não há um deus a exigir que soframos. Tudo muletas para fugir do inevitável. Somos meros conglomerados de átomos conscientes de nossa fragilidade e finitude. Diante de tamanha incapacidade de aceitar que não há plano nenhum, que somos livres para fazer, ser, gozar – ou mesmo sofrer – apelamos para o sobrenatural e jogamos a culpa de nossas frustrações para longe de nossas costas.

Eu não sei você, mas eu estou aqui para me divertir. Eventualmente sofro quando algo não dá certo, mas não aceito o sofrimento como uma pena capital/divina da qual não posso fugir. Na maioria das vezes sofro por culpa única e exclusivamente minha. E é ai que busco o melhor, a superação e o prazer.

Eu não nasci para sofrer.

Fui.

autoretrato

01.julho.2010
não vejo reflexos
meu rosto desaparece
tudo passa tão rápido
não noto os detalhes
mas me vejo no silêncio
nos intervalos entre mundos
sou menos que a infinitude
sou mais que o singular

Edgar foi pro bar…

16.junho.2010

Um dia, nos áureos tempos da minha infância, eu devo ter me imaginado adulto. Eu não me lembro, mas deve ter acontecido. Todos nós, em algum momento, projetamos nosso futuro.

Na adolescência, os planos eram muitos, mudavam a cada dia. Melhor fase de nossas vidas, os anos incríveis da adolescência são tesouros percebidos apenas na maturidade e, obviamente, perdidos nas ondas do tempo.

Não que a vida na adolescência seja fácil. Ela pode ser tão ou mais cruel que a vida adulta, mas com a vantagem de ascensão ao mundo adulto, possibilidade de mudança. Já adulto, ascensão mesmo só a morte…

Já se dizia na antiga escola de Sagres que

navergar é preciso, viver não é preciso

e essa imprecisão da vida, em certa medida, nos empurra para o título desta postagem.

Edgar foi pro bar e vai beber até morrer. Paráfrase da banda das Velhas Virgens (não a do Mazzaropi, a do Paulão) é expressão metafórico-realista dos dilemas do jogo social.

Diante da desesperança que por vezes nos assola, frente as hipocrisias e jogos perversos que o mundo do trabalho nos coloca, o bar é o anestésico da raiva e o energético do tudo passa. No bar afogamos as mágoas, as desilusões, a frustração, o medo… no bar restauramos as forças… beber até morrer e, tal qual a mitológica fênix, renascer (com uma baita ressaca) para uma nova partida, uma nova batalha.

O bar é o refúgio deste filósofo etílico nos momentos de crise. Mais que uma fuga (pois sempre fugimos) é um local de metamorfose, de troca, de simbiose. O bar ultrapassa os botecos das esquinas do mundo. O bar é antes uma atitude, um posicionamento.

Certamente você, que chegou aqui sabe-se lá por que, tem o seu bar. Tem o seu refúgio. Tem a sua bebida-elixir… metafórico ou real, público ou particular, eu sei que você tem.

Salut!

Heisenberg nosso de cada dia…

10.junho.2010

Werner Heisenberg, físico alemão, formulou o princípio da incerteza, uma das grandes contribuições para o desenvolvimento mecânica quântica no início do século XX.

De forma muito simplificada, o princípio afirma que não é possível medir simultaneamente a posição e a velocidade de uma partícula. Quando se mede um, perde-se a precisão da medida do outro. Dai a incerteza. Apesar de ser um entusiasta da física teórica, a física acaba aqui.

Deslocamentos são práticas comuns na filosofia… se deslocarmos a incerteza inerente ao princípio formulado por Heisenberg das partículas para nossas vidinhas cotidianas, veremos que também somos regidos pela incerteza.

Apesar de algumas pessoas confiarem dogmaticamente nos desígineos de uma ou outra divindade qualquer, acreditando que tudo está traçado e definido, a verdade é que não temos certeza de nada!

David Hume, um grande amigo meu, na sua epistemologia dizia que confiamos que certas coisas tornarão a acontecer mais por força do hábito que pela certeza (ou decorrência lógica). Trocando em miúdos, o fato do sol ter nascido todas manhãs nos últimos 37 anos não me dá base epistemológica nenhuma para afirmar com 100% certeza que o mesmo ocorrerá amanhã.

Hume usa o exemplo das bolas de bilhar. Prevemos a trajetória de uma bola que recebe o impacto de outra simplesmente porque vimos isso acontecer antes, mas fosse o caso de nunca termos presenciado um jogo de bilhar, não poderíamos afirmar que o impacto de uma bola sobre a outra produziria movimento .

É o hábito que nos dá a sensação de certeza. Vejam Desmond Hume, personagem de LOST. Ele ficava digitando sequências numéricas em um Apple II a cada intervalo de 109 minutos, sob o risco de explodir a ilha caso não o fizesse. A semelhança de um Hume com o outro não é coincidência, menos ainda a de um certo Locke colocar Hume (o da ilha) em dúvida.

Ok,   acordamos hoje. Qual a certeza de acordarmos amanhã cedo? Nenhuma. Esperança talvez. Certeza, só com base na fé, que ainda assim, vem do hábito. Hume é foda! Heisenberg idem.

Sei que viver na corda bamba é difícil. Nada como a boa e velha segurança de que tudo vai seguir como sempre seguiu… balela! Wake-up Neo!!!

A vida é incerta quântica e filosoficamente falando. O hábito nos conforta e, quando desestabilizado pelo acaso, nos aflige. Saber disso não torna a vida mais fácil, mas menos misteriosa.

A única certeza é que tudo é incerto. Acostume-se a isso!

🙂

Tô vivo… ainda!

11.maio.2010

Como diria um grande amigo: tá osso!

Muita correria e pouco tempo para escrever sobre o que realmente importa…

Sigo vendendo minha força intelectual de trabalho a troco de uns cobres, engrossando a mais-valia de uns poucos!

Dá pra ser de outro jeito? Talvez, mas sem Marx, ok?! Vamos superar Marx… certamente é o que ele faria…

Assim, vamos tocando o barco… entre uma Colorado e uma Heineken!

[]’s

Entre o azul e o vermelho

15.abril.2010

Talvez uma das grandes questões em aberto na humanidade seja: o que é a realidade?

Muito se discutiu, se discute e se discutirá a respeito dessa curta indagação. Filósofos, pensadores, intelectuais, músicos e mesmo o matuto sentado a beira do caminho, mascando o talo de um capim qualquer ou a lavadeira que beira o ribeirão a clarear lençóis, todos, em algum momento ou outro, já se puseram a pensar sobre a natureza da realidade. É certo que o fazem por métodos diferentes, seja a filosofia, a mecânica quântica ou a vivência empírica o método utilizado, sempre se pode refletir, filosofar, teorizar ou, simplesmente, matutar a cerca da realidade.

O que é tudo isso? De onde?, para onde? e, mas incompreensível ainda, para que? são as modalidades de questionamento que povoam corações e mentes. A busca de propósitos, significados, justificativas para a realidade é o cerne de uma das mais cruéis demandas da humanidade. A experiência racional ou empírica da vida nos conduz a necessidade de entendimento. Meu grande amigo Aristóteles, certa vez, me disse que todo homem, por natureza, deseja conhecer. Tentamos conhecer, compreender, entender, decifrar, explicar, significar nossa existência. Isso, o questionamento, não ocorre a todo momento, mas eventualmente ocorre e, quando ocorre, caímos no “buraco fundo” da cantiga de roda.

Hoje é Domingo
Pede cachimbo
Cachimbo é de barro
Bate no jarro
O jarro é de ouro
Bate no touro
O touro é valente
Bate na gente
A gente é fraca
Cai no buraco
Buraco é fundo
Acabou-se o mundo

“Gente é fraca, cai no buraco / Buraco é fundo, acabou-se o mundo”. Aprendi essa cantiga quando criança. Não me lembro se com meus pais, avós ou professoras. O fato é que nada mais preciso para definir nossa relação com o entendimento sobre a realidade. Não questionar, não preocupar-se ou, simplesmente, ignorar a angústia que a existência nos acomete é uma opção. Vez ou outra somos levados à beira do buraco da dúvida e, frequentemente, tomamos as inúmeras pílulas azuis que nos remetem a normalidade e a aceitação de que tudo anda bem, são elas que nos afastam do buraco, vitaminando nosso espírito, dando-nos força e sustentando o mundo. A pílula azul nos vem nas mais variadas formas e não vou discuti-las aqui, afinal quem as consome com frequência, geralmente não está disposto a reconhecer seu vício e, menos ainda, a debatê-lo. Isso posto, vamos em frente.

Somos fracos. Gente é fraca. Somos pó. Do pó viemos e ao pó voltaremos, mas pó de estrelas. Somos nada. Essa fraqueza existencial que nos arremessa ao buraco da dúvida é a condição humana. Cair no buraco é aceitar a pílula vermelha e, com ela, acaba-se o mundo, a normalidade, o certo, o ideológico, afinal “tudo que é sólido se desmancha no ar”. Nossa fraqueza é nossa maior qualidade. Fraqueza que se mostra no princípio da incerteza. Fraqueza que está longe de ser covardia ou qualquer outro sinônimo de incapacidade. Forte, sólido, é aquele que não se move, não muda, que não é fraco. A fraqueza é mobilidade. A realidade é frágil, ainda bem!

Acabou-se o mundo. Com isso acaba-se a cantiga. Perceber a fragilidade da realidade é um acabar-se o mundo sólido, forte e de contornos bem definidos, que nos dá segurança, confiança e até um certo conforto… desde que se tenha à mão uma pilulazinha azul. Sem ela, o mundo entra em colapso e precisa ser reinventado, resignificado, reconstruído a todo momento, na dança frenética de Shiva.

Diferente da azul, a pilula vermelha é mutante, frágil como a mesma realidade nela contida. Nunca está disponível na mesma forma. Nunca se encontra no mesmo lugar. Efêmera e transitória, a pilula vermelha exige uma constante perseguição. Se na cantiga de roda o mundo se acaba no buraco (de minhoca) sem fundo, cada buraco é uma porta para um novo universo, uma nova realidade e uma nova oferta de pilulas… escolha a sua e boa viagem!