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Ato e Potência

27.outubro.2010

Aristóteles, um grande amigo das antigas, me ensinou muita coisa. Uma delas é a noção de Ato e Potência, explico.

Pense numa semente. Em ato a semente é o que ela é. Um grão mínimo. Mas nessa mesma semente há uma potência, ou potencial, uma parte oculta que está contida na semente, a árvore. Antes mesmo da semente ser plantada, já está dentro dela, em potência, uma árvore. Mesmo que essa semente nunca venha a ser plantada, ainda assim a potência está lá, aguardando as condições ideais para, nesse caso, germinar.

Pessoas são sementes. Nascemos pequeninos, feios, enrugados, banguelas, analfabetos e pelados. Em ato, um recém nascido nada pode compreender da linguagem dos outros humanos que o cercam, mas está lá, dentro daquela “carinha de joelho” a potência da fala.

Muito tem me incomodado certas críticas que se fazem aos jovens de hoje em dia. Olha-se o adolescente em ato, que por natureza é um ser desajustado, seus hormônios estão ainda em fase de calibração. O adolescente, com seus gostos, modas e manias é tido como banal e vazio. Vazio? O adolescente, em ato, é pura potência. É um adulto raspando a casca que o separa resto do mundo, para mudar de metáfora.

Eu não sou mais jovem, mas ainda não me esqueci das palavras do velho Aristóteles, que um dia já foi adolescente também. Será que o jovem Aristóteles em ato adolescente demonstrava a potência filosófica lá contida? Duvido.

Assim, antes de sair por ai criticando essa molecada colorida de hoje em dia, lembre-se das críticas que você ouviu quando ainda era ovo, semente ou adolescente. Lembre-se daqueles adultos chatos que só esculachavam suas ideias, suas roupas, suas música. Lembrou? Agora vá ao espelho e se olhe, pois você hoje é um deles.

É isso!

Emos, uma persperctiva fora de foco…

05.agosto.2010

Olá pessoal!

Hoje o assunto é mais denso e a postagem pode ficar mais extensa que o habitual, prepare-se ou vá para o Google e tente outra coisa!

Geração perdida, o futuro do planeta está condenado pela falta de crédito nessas tribos atuais: os emos, vampiros românticos, coloridos etc.

Ok, sou um educador. Convivo diariamente com alunos e alunos do Ensino Médio e Ensino Superior. Essa mobilidade entre dois submundos escolares me permite apreciar com mais ponderação àquilo que o senso comum pratica ou condena.

Mas antes de falar dessa geração de adolescentes depositária do infortúnio vindouro, voltemos no tempo…

Em 1985 eu era apenas um garoto de 12 anos, vivendo em meio à explosão do New Wave. Roupas alucinatemente coloridas, estampas e padrões quadriculado, xadrez, listrado etc. Gel com glitter, ombreiras e mais um pandemônio de opções estéticas características do New Wave. E eu odiava. Achava ridículo, feio e me recusava a vestir-me daquele jeito. Era um em um milhão. Minha praia era outra…

Metal. Calça rasgada, surrada, suja. Tênis estrupiado. Camisetas de bandas: tecido preto e estampa de capas de álbuns ou logotipos. Cabelo comprido, broches de caveira, pulseiras com metais etc. Eu era um marginal. Marginal no exato sentido da palavra. Estava à margem do convencional, e o convencional estava longe de ser unânime.

Pessoas mais velhas que eu também não gostavam do New Wave. O visual era chocantemente exagerado. A música era vazia tanto em conteúdo quanto em melodia dizia a geração anterior, acostumada ao clima de protesto politicamente engajado. Mas o New Wave era legal, estava na novela, nas passarelas, nos outdoors…

Já o pessoal do metal, punk, dark e afins era o prenúncio do apocalipse para o pessoal do New Wave. Geração maldita, não se vislumbrava futuro neles. Era uma época estranha. Rechaçado pelos contemporâneos coloridos e psicodélicos, desacreditados pelos mais velhos, minha tribo estava fadada a morrer (provavelmente numa cadeia ou presídio).

Ok, voltemos a 2010.

Emos, geração maldita. Futuro sombrio. Balela!

O mundo dos homens é uma constante assincronia entre gerações. O New Wave passou e o mundo girou. Os “metaleiros” cresceram, tornaram-se pais, advogados, médicas e, pasme, professores! O mundo sobreviveu às previsões apocalípticas das tribos mais velhas, pretensas donas da cultura, dos hábitos e do que é certo.

O universo Emo não me agrada. Assim como não me agradava a Tropicália. O mundo é assim, repleto de tribos, gostar de uma ou de outra é algo tão subjetivo que dificilmente será alvo de consenso.

Mesmo no mundo do metal, o que se faz hoje não me agrada muito. Eu cresci ouvindo deuses e suas bandas. Nada que veio depois dos áureos anos 80 me seduz. Korn, pra deixar meu amigo anacrônico Rafael Gimenes louco, é tão insípido quanto Restart, pois ambos não fazem parte do momento que eu vivi. Nem mesmo o Ozzy de hoje é mais o mesmo de 20 anos. Ozzy virou um vovozinho simpático que já teve até Reallity Show! Cadê aquele insano que mastigava morcegos? Foi-se…

Quem nasceu depois dessa conversão do Ozzy em vovozinho, pode até curtir o Ozzy, mas não sabe quem realmente o Ozzy foi! Só quem viveu aquela época conhece… (isso vale para mim, que até acho Beatles legalzinho, mas meus professores também me diziam: “Você ouve Beatles, mas não tem a menor noção de quem eles foram…”)

Somos seres inseridos no tempo e no espaço. O tempo de cada um deixa marcas que fossilizam-se em nossa personalidade e cada era, cada geração valoriza o seu registro temporal. É um fato inerente a vida humana!

Agora, vamos para o futuro (do passado). Eu era uma promessa de fracasso se levarmos em conta o prognóstico daquelas pessoas que viam na minha geração uma geração sem futuro, vazia. Pobres coitados, eles erraram. Cá estou eu, adulto, educador. Cá estou eu, realizando um futuro bastante diferente daquele profetizado pelos meus pares anos atrás. E, cá estou eu, profetizando que depois da minha geração o futuro será desastroso… ops, estava!

Meus alunos e alunas vivem outra época. Um tempo e um universo paralelo ao meu. Como educador, ou eu mergulho nesse universo, ou fico distante, incomunicável. Eu decidi mergulhar. E, para ser sincero, os tempos são outros, mas pouca coisa muda depois de um olhar mais atento…

Percebi que “eu fui dar mamãe, fui dar um serão extra com o patrão” de Dr. Silvana não é melhor que a capciosidade do funk carioca, só é diferente. Adolescentes gostam de sacanagem, e a música sempre reflete isso. Apenas os ritmos que embalam uma tribo ou outra é que muda. O mela-cueca de Brian Adams e o romantismo açucarado de sertanejos universitários é mais do mesmo, com uma roupagem diferente.

No cinema ocorre o mesmo. American Pie nada mais é que uma releitura atualizada para os adolescente de hoje das mesmas situações vistas em Porky’s, Picardias Estudantis e A Vingança dos Nerds. Eu sou muito mais Porky’s que American Pie, mas é porque eu fui adolescente em outra época. Os dilemas amorosos entre vampiros virgens, lobisomens depilados e menininhas bobocas não são muito diferentes de Garotas de Rosa Shocking e Namoradas de Aluguel… a linguagem é outra porque a tribo é outra, mas os dilemas são os mesmos.

Enfim, antes de sair por ai tacando o pau naquilo que é diferente de você, por mais que isso te incomode, daqui 20 anos haverá algo que os próprios desacreditados de hoje desacreditarão amanhã. E, daqui 100 anos, tudo isso será resumido num verbete qualquer de uma enciclopédia qualquer. Daqui 1000 anos será insignificante.

Eu não gosto do universo cultural dos Emos, mas consigo compreender a indignação desdes quando são desacreditados e avacalhados. Não gosto, mas sou tolerante, pois daqui 20 anos, serão os médicos, advogadas e, pasme, professores dos meus futuros filhos, estes sim, a geração maldita de daqui 20 anos, e sei lá eu qual será a denominação deles… mas o conflito é certo!

É isso.