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O Tao das Séries!

13.novembro.2010

Sabe aqueles dias em que você acorda meio perdido, pensando que algo não está dentro da normalidade? Como se você estivesse em um flashback de Lost, sua mente te remete a situações do passado, mas não está muito claro se elas foram reais ou não, afinal nossa imaginação também funciona de maneira reversa, implantando falsas memórias ou, por vezes, distorcendo-as.

Eu já naveguei por mares metafísicos, mas minhas leituras, ainda adolescente, sempre me conduziram para uma seara mais científica. Do misticismo infantil dos Coelhos da vida, cai nas teias de Fritjof Capra. O Tao da Física tirou-me, literalmente, do chão. Essa leitura mostrou-me que aquelas ideias loucas do Richard Bach, de existências paralelas, nada mais eram que conceitos da física contemporânea romanceadas na veia literária de Bach. Capra me fez perder o encanto pelo lirismo e mergulhar na cientificidade da coisa…

Enebriado pelas leituras no campo da física quântica, da teoria das cordas e dos relativismos de Einstein, logo percebi que Capra era outro mago vendendo conceitos embalados em pseudo-filosofia oriental. Saiu Capra e entrou Prigogine, esse sim legítimo homem da ciência, abalou minhas estruturas com O fim das Certezas. Dai em diante fui me cercando de autores que levavam ciência a sério. Stephen Hawking lançou-me, sem dó nem piedade, no centro de um buraco negro, sequer tive possibilidade de gravitar próximo ao horizonte de eventos…

Tudo isso se deu na minha juventude, ou pelo menos no início dela, aos 20 anos, pois ainda me considero um jovem… mais maduro, mas ainda jovem!! Hoje, próximo dos 40, tudo aquilo que eu li e reli, afinal física teórica nunca foi o meu forte, está impregnado no cotidiano de um universo fantástico, que me trouxe de volta à magia do lirismo, repaginado sob novas formas de expressão: as séries de TV.

Sou fã de carteirinha de algumas séries. Algumas me remetem aos heróis da infância, como Smallville (sim, eu ainda acompanho Smallville, por duas razões não muito racionais: a) a mórbida curiosidade em saber que fim Kal-El leva nessa releitura do Homem-de-Aço; b) Erica Durance). Mas antes que você vá lá nos comentários me zuar, outras séries me agradam pela ficção científica: Battlestar Galactica, Caprica, Stargate Universe… e tem aquelas que exploram os conceitos que, como escrevi acima, tiraram-me do meu sono dogmático do mundo místico. Eis algumas:

Lost

Todo mundo conhece Lost. Se não conhece, deveria. Lost usa e abusa das interpretações e possibilidade sobre as implicações que as descobertas nos campos da física contemporânea. Viagem no tempo e realidades paralelas são pano de fundo de uma excelente trama, que tem seus altos e baixos ao longo de seis temporadas. O final de Lost dá uma escorregada mística, que não me agradou, mas ainda assim a série é uma ode às esquisitices contidas nessa casca de noz em que vivemos.

The Big Bang Theory

Eu rio muito com essa série. Rio porque entendo o que o Sheldon quer dizer quando faz uma ironia com o Efeito Doppler (certa vez expliquei o que era o efeito doppler ao meu sobrinho de 13 anos, que também acompanha a série e, ao final, ele me olhava como se eu fosse o próprio Sheldon!) A série é boa porque trata de assuntos científicos com o rigor devido sem perder o caramelo cômico que dá sabor ao que seria intragável em um documentário da BBC. O único problema da série e aquela loirinha feia que só atrapalha a vida do quarteto nerd… BAZINGA!

Fringe

Eu confesso! Parei de assistir Fringe no final da primeira temporada. Parei porque Fringe merece atenção total. Quase como Lost. A série a princípio parece ruim. Quando vi que um dos principais personagens era o vizinho do Dawson (Dawson’s Creek) pensei: deve ser uma bosta! (Olha quem fala, o cara assiste Smallville, adiantando a mente de algum possível leitor…). O fato é que Anna Tov fazia a série valer a pena. Fringe é uma série que trata de universos paralelos, ciência e uma vaca. Fringe é a série que eu vou assistir quando eu puder me fechar na sala de TV e ver do primeiro ao último capitulo sem pausas ou interferências…

Enfim, o contato com essas séries me permitiu resgatar toda aquela teoria lida sobre a física contemporânea e visualizar suas implicações e possibilidade numa plasticidade e fotografia que só a linguagem televisiva poderia fornecer!

Por hoje é só!

Six feet under

26.agosto.2010

Certa vez, na madrugada, zapeando entre os canais da TV aberta, peguei um trecho de uma série sobre uma família que administrava um funerária. Assisti o restante do episódio e achei interessante, mas não guardei o nome da série e, entre a correria do dia-a-dia, me esqueci dela. Me esqueci até o dia que minha amiga* Larissa Herbst (@larissaherbst) postou algo sobre a série em questão: Six Feet Under. Como eu e Larissa temos gostos em comum no que se refere a séries (Battlestar Galactica, Dexter, Big Bang Theory e Lost, claro.) resolvi conferir.

Eu ainda estou na 2ª temporada, mas acho que já posso dizer algo. Six Feet Under é densa, coisa que para alguém como eu, com formação em Filosofia, é um grato presente. O fato de a série mostrar o cotidiano de uma família californiana que administra uma funerária pode, inicialmente, sugerir que a série trata sobre a morte. Ledo engano. A série usa a morte de pessoas e os rituais fúnebres que se desenrolam no espaço da funerária apenas como pretexto para discutir a vida.

Eu não vou falar aqui sobre os episódios em si, até porque como eu já disse, ainda estou na 2ª de cinco temporadas. O que eu quero abordar nesta postagem, que pode ficar longa já que estou sem acesso a internet enquanto escrevo (por conta duma falha da NET, thanks!). Bom, chega de divagação…

Quando a morte se inicia? Quando se morre, oras. A percepção do senso comum é, mais ou menos, de que a morte começa com a suspensão da vida. Será? Eu diria, e posso parecer pessimista com isso, que a morte começa quando o espermatozoide encontra o óvulo. Ali, no momento em que as células começam a se reproduzir, seguindo o código-fonte da vida, começa o processo de morte. E justamente no instante da fecundação que, numa concepção aristotélica, começa a corrupção da matéria.

Platão dizia que as ideais existem antes num mundo separado da realidade, o mundo das ideias. Lá as ideias existem na perfeição e são incorruptíveis, ou seja, eternas. Cá, no mundo das sombras, dentro da caverna, as coisas são meras aproximações, cópias mal feitas das ideias perfeitas. Aqui, dentro da caverna, tudo se degenera, inclusive a vida.

Vida e morte são aspectos de uma mesma coisa: a nossa finitude. Otimistas dizem que o copo está meio cheio; pessimistas, que está meio vazio. Se é a vida ou a morte que começa com a fecundação, isso é uma questão de perspectiva e, ai sim, é que Six Feet Under nos permite filosofar.

A morte é um problema para quem fica. Lidar com a dor, o sofrimento ou, contrariamente ao senso comum, com a alegria e o alívio são questões abordadas na série. A dimensão psicológica da vida humana se fragmenta nos dilemas cotidianos das personagens. Mas a série não fica apenas no psicológico. Questões sociais tais como o capitalismo selvagem que corporativiza tudo, inclusive a morte; os preconceitos de raça e gênero, bem como o (des)equilíbrio dos relacionamentos são tratados.

A série me agrada pela diversidade de contextos. Da adolescente perdida na profusão de possibilidades que o ingresso na vida adulta oferece, à matriarca que redescobre essas mesmas possibilidades perdidas, a série desfila um rol de personagens complexos e, de certo modo, apaixonantes. Não é difícil se reconhecer em uma ou outra situação encenada nos episódios nem mesmo deixar escapar uma ou muitas lágrimas como bem profetizou a Larissa, quando me indicou a série. (E aqui eu abro um parenteses! Sim, homem também chora!)

Agora vamos falar um pouquinho sobre a morte. Morrer é, ao mesmo tempo, um processo biológico ao qual estamos todos fadados e um processo psicossocial regido pelas mais diversas concepções culturais. Encaramos a morte como dor e sofrimento ou alegria e alívio conforme fomos educados em nossas culturas. Lidar com a morte é uma experiência que somente os vivos podem exercer. Com exceção ao discurso charlatanista de um bando de oportunistas, ninguém sabe ao certo quando vai morrer. Fortuna, a deusa romana da sorte, através de sua roda decide os destinos dos vivos. Numa interpretação mais científica, o caos, o acaso é a força que move a roleta russa (desculpe o trocadilho Nikolai) da vida. Morremos um pouco a cada momento. Nascemos para isso, para morrer.

Calma, não fique assim tão angustiado ou angustiada. Six Feet Under, ao seu modo, mostra que diante da morte só há uma escolha: viver. Na verdade, diante da morte há um séquito de escolhas: como viver a vida. E aqui é que se encontra mais uma riqueza da série. Cada personagem, dos fixos aos itinerantes, mostra uma perspectiva de como viver. Se elas são boas ou más, se são as melhores ou piores, eis o domínio da filosofia, saber o que é o bem e o mal é uma questão pra lá de complexa e, nesse sentido, a filosofia só pode te ajudar a compreender suas escolhas, assim como Six Feet Under pode apenas te mostrar que os seus dilemas são os dilemas de milhares de outras pessoas…

É, se você chegou até aqui, saiba que não há formula mágica. Fortuna, a deusa, esta lá, girando sua roda caótica. E você, vai fazer o que hoje? Pois pode ser que amanhã eu te veja no seu velório… ou o oposto!

* Nota: Larissa foi minha aluna por uma ou duas semanas ainda no ensino médio, suas escolhas a levaram para outros rumos, mas por conta das tecnologias da informação, sempre estivemos, de alguma forma, em contato. Embora meu contato com a Larissa seja muito mais virtual do que presencial, ainda assim eu a considero uma boa amiga e (momento jabá) uma ótima designer de interfaces! Confira.