Fragmentos…

O quê eu faço aqui? Bem, essa resposta é complexa. Talvez você já tenha me lido por aqui mesmo e pense que eu ressurgi do nada. Talvez você tenha me lido no outro blog. Dois eus? Não e sim. Dois talvez seja pouco, talvez eu seja muitos, é que fragmentar-me é a forma mais sensata do exercício de ser eu. Será?

Quantos defeitos sanados com o tempo
Eram o melhor que havia em você?

Aquela velha canção do Oswaldo, o Montenegro, sempre acha um jeito de me atormentar. Às vezes ela surge do nada numa playlist qualquer. Às vezes emerge de minha memória. Pouco importa como me venha, é uma daquelas músicas que sempre nos coloca a pensar.

Certa vez, em Porto Alegre, escrevi sobre amor e trens, acho que foi aqui. Trens são legais. Há uma locomotiva, força motriz da composição. Nos meus tempos de menino, a professora pedia para a gente escrever uma composição. Nessa época algo nos movia a escrever composições. Bom, a bem da verdade, acho que algo nos empurrava. Voltemos ao trem. A composição é o conjunto. Locomotiva e vagões. Força motriz e histórias. Cada vagão carrega uma de nossas histórias, que eu gosto de chamar de fragmentos. Cada fragmento do trem ocupa uma vaga. Puxados pela locomotiva, vagam pelos trilhos que, longe de terem destino certo, depende dos caprichos do maquinista. Há desvios, há encruzilhadas, há pontes e, por vezes, descarrilamentos. Lulu Santos cantou que a vida quase nunca é um balão. Óbvio, ela é um trem. Será?

Meus defeitos, o que de melhor havia em mim. Passei algum tempo achando que eu tinha algum defeito. Desses, de fabricação. Um parafuso solto. Pior, um parafuso torto, daquele que empena e não há ferramenta que dê jeito. Sim, não vou me omitir. Errei mais vezes que a cota de isenção de julgamentos permite. Mas errar, diz o ditado, é coisa nossa, coisa de gente, coisa das gentes, pois gente não é singular, gentes são plural. Muitos vagões, cada qual com suas bagagens. Muitas locomotivas. Algumas tão azeitadas e eficientes, coisa de inglês. Outras, enferrujadas e dormentes. No mais das vezes, apenas trens, normais, comuns, gentes.

a gente não está com a bunda exposta na janela pra passar a mão nela!

Gonzaguinha fala da gente. Canta, na verdade. Não, não de eu ou você (ou seria eu e você? será?). Fala da gente, das gentes. A gente tá ai, tamos ai, mas não tamos de bobeira. Por isso o grande amor da sua vida não está lá, num trem em Porto Alegre. Alguém pode estar a se perguntar, que sei eu sobre os grandes amores? Muito pouco. Apesar de eu, assim como Martinho, o da Vila, ter tido tantas mulheres, quase nada sei sobre grandes amores. Muitas vezes, já que estamos em Porto Alegre, tudo se resume a um refrão de bolero.  Engenheiros entendem de trens, ouça-os!

A vida é feita de fragmentos. Costurados, eles contam a nossa trajetória. A costura aparentemente segmentada que junta dois tecidos é, na verdade, uma trama que traça trilhos, traça trilhas. É a cartografia de nossa existência. Alguns vagões podem se perder, descarrilar. Às vezes é a locomotiva que para, nos deixando de repente. Por vezes, o maquinista entra em greve. É na composição que o sentido se encontra. Compor está além do rimar, do musicar, do inventar. Compor é contar. Eu, menino distraído que mal compunha o que a professora pedia, um dia, mais atento, atentei ao caminho. Ali, sozinho, errando pelo caminho, avistei uma luz. Um trem. Aonde, perguntei-me. Ali… Respondi-me. Não sei se no fim do túnel, não sei se no começo… Será?

E assim, no fim do texto, é que começo a falar das gentes (ou seria da gente?). Assim começa a composição… será?

EdMort

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Uma resposta to “Fragmentos…”

  1. HELEN ARRUDA Says:

    Amo seus textos, suas viagens…

    Enviada do meu iPhone

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